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Publicado: Sábado, 29 de setembro de 2012

Oba, leitura!

Crédito: La Lecture de Pablo Picasso Oba, leitura!
Leitura solta dentro da escola: música doce aos ouvidos da alma!

Depois de uma semana repleta de trabalho, volto pra casa com a alma leve e a Edna na cabeça, ou melhor, no coração. Só o coração pode compreender as coisas bonitas feitas por essa mulher.

Edna é uma professora corajosa, capaz de manter em sua prática pedagógica a postura contraescola; e aqui nasce um paradoxo: sua atitude só se revela contraescola porque é realizada dentro da escola. Confuso? Calma, eu posso explicar. 

Já disse, outras vezes, neste mesmo espaço, que defendo a postura contraescola, dentro das escolas, para combater as ações engessadas num único jeito de ver tudo sempre do mesmo jeito.

Num contexto de tantas mudanças, a escola tem sido, talvez, a única organização que insiste em replicar os mesmos espaços e processos de muitos anos atrás. Vitor Paro, educador e pesquisador da USP, disse recentemente, em um dos seus trabalhos, que "considera absurdo que hoje, com todo o desenvolvimento da Ciência, se faça o que se fazia há 200 anos nas escolas: confinar crianças em um espaço restrito e imutável como a sala de aula”.

Quase que como um protesto, Edna, mesmo sem ter ouvido a queixa de Paro, nos mostra que é possível traduzir nas práticas pedagógicas o sentido de que Escola é lugar de gente.  Gente mutável, que não está pronta. Gente que ensina e gente que aprende num espaço com mais roda e menos parede, com mais riso e menos cimento, mais alegria e menos caderno.

Inspirada nas palavras de Rubem Alves e certa de que a escola não tem o direito de estragar a magia da leitura descompromissada, Edna criou o projeto “Oba, leitura!”, destinado à oferta de leitura do jeito que Alves defende: “solta, vagabunda e sem relatórios”. Em qualquer tempo e espaço, seus alunos podem vestir a capa de leitor e sair pela escola oferecendo leitura aos colegas, inclusive de outras turmas.

A ideia deu tão certo que o projeto aos poucos foi crescendo e se reinventando. Hoje, além dos alunos da Professora Edna, pais, funcionários e professores da escola toda, atuam como leitores e ouvintes de literatura boa: música doce aos ouvidos da alma. E isso a qualquer hora do dia. Quem lá trabalha sabe disso: de repente, no meio de uma aula de Matemática ou de uma faxina nos banheiros, você pode ser surpreendido por um menino-leitor vestindo uma das diversas capas criadas na temática dos gêneros textuais; e dele, receber bons minutos de leitura solta. Mas atenção, se o receptor não disser a senha mágica: “OBA, LEITURA”, a oferta não acontece; porque afinal, sabemos todos, que quando um não quer, dois não... leem!

Com isso, sem tarefa exaustiva ou cópia mecanizada; sem caneta vermelha apontando erro e corrigindo carência, crianças e adultos seguem aprendendo numa escola de gente.

Gente como eu, como você e como a Edna.  Portanto, salvem as Ednas!

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