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Publicado: Sábado, 16 de janeiro de 2010

O Haiti de todos nós

O Haiti de todos nós
A compaixão inspira justiça

Não há dor maior, se é que ela pode ser mensurada, do que a dor de uma mãe segurando a filha morta nos braços. E ainda que eu nunca tenha experimentado, sinto-a como se fosse minha.

 

As imagens de dor e horror de milhares de pessoas procurando seus familiares no meio dos escombros, me fez chorar... E sofrer com cada história esmagada pelo terremoto que devastou um país já em desespero.  

 

Essa dor denomina-se compaixão. Compaixão, segundo Rubem Alves, é uma qualidade espiritual: “Eu, indivíduo, não estou sofrendo. Sozinho estou feliz. Mas olho para um  outro que está sofrendo: um menino sem agasalho, numa noite fria, pedindo uma moedinha, tarde da noite num semáforo. E, de repente, eu começo a sofrer um sentimento que não é meu, é do menino. Fico fora de mim. Estou no corpo do menino”.

 

As palavras de Alves me fizeram lembrar a primeira vez que escrevi para um jornal. Movida pela compaixão, não suportei a dor do outro: um menino descalço, no meio da noite, pedindo comida. Não uma noite comum: festejava-se a chegada do ano de 1988. Em forma de protesto, as palavras que escrevi diziam da hipocrisia social em comemorar a data com “champanhe e caviar”, enquanto meninos abandonados dormiam pelas ruas da cidade.

 

A compaixão ensina ética social. Quando sou capaz de me colocar no lugar do outro, sou incapaz de maltratar a natureza, o animal e o homem. Os animais não sentem compaixão. Por isso, reproduzem as mesmas ações: o cachorro, o pássaro, o peixe, desde suas primeiras aparições no planeta continuam desenvolvendo os mesmos padrões de comportamento. Assim também é com a natureza. As plantas seguem os padrões das espécies... O ipê, a lágrima de cristo, a moréia, a bela-emília são iguais desde sempre. 

 

E os homens? Ah, esses são inexplicáveis... 

 

Embora o sentimento capaz de diferenciar a espécie homo sapiens das demais espécies esteja ao alcance de todos, poucos são capazes de compaixão. E isso nos permite classificar a existência de duas categorias em nossa espécie: os que são capazes de compaixão e os que não são. Porque do contrário, a violência e a fome não existiriam, nem tão pouco a pobreza e o sofrimento extremo de pessoas ao nosso lado. Também não seria possível a gestão política de corruptos, verdadeiros ladrões de leite das criancinhas, livros dos estudantes e saúde da população. Políticos nojentos, culpados pela fome e miséria do mundo. (Está na hora de selecionar político pela capacidade de compaixão desenvolvida ao longo do seu currículo!)

 

A compaixão inspira justiça, pondera ambição, equilibra as emoções, humaniza as relações. E salva vidas. Quem sabe o grito, o sangue e o drama dos haitianos possam destruir os incapazes de compaixão. E, então, salvar o mundo.

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