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Publicado: Sábado, 31 de outubro de 2009

Nos arredores do "sobradão"

Meados dos anos quarenta.

Tino, Zé Henrique, Durval, Plínio, Nego. Mais o Cardosinho e às vezes o Chinho também. Esses os nomes dos mais chegados, que afloram à mente, assim numa busca sem ordem e sem preocupação de melhor pesquisa.

Deveria haver vários outros, menos constantes.

Assim se compunha a criançada da Barão do Itaim e adjacências.

O raio de ação das inocentes molecagens se estendia pela Travessa Monsenhor Monteiro, de uma quadra só, a cujo final, no encontro da rua dos Andradas, desdobrava-se por uma quadra acima e outra abaixo. O jardim do Carmo, todo ele servia de amplo espaço para os folguedos de mocinhos contra bandidos, com carruagens imaginárias e tudo.

Surtos pela Praça Padre Miguel, pouquíssimos. Mas também aconteciam.

Note-se que isso equivale a dizer que os pais não precisavam se preocupar com o paradeiro dos filhos, que, de sua parte, sabiam da hora de retornar. Sossego e tranquilidade, para uns e outros, portanto.

A disputa acirrada, com bola de meia, no bequinho estreito, se feria entre são paulinos e palmeirenses, estes Zé Henrique e Durval, dois contra dois; tricolores, Tino e Bernardo.

Saber pelo nome quais os atletas das equipes do coração, denotava importância e tinha-se quase por obrigatório. De alguns times, com prováveis erros e enganos, a gente até gravou a escalação. Arrisque-se a do São Paulo Futebol Clube: Mário, Savério e Mauro; Bauer, Rui e Noronha; Friaça, Ponce de Leon, Leônidas, Remo e Teixeirinha.

Na inocência daquela época de dias calmos e longos com horas espichadas – ninguém vivia apoquentado de afazeres sem fim; era quando as crianças tinham tempo para brincar - a grande algazarra, a preferida dos moleques, consistia em invadir obras em andamento e brincar de pular nos montes de areia, em fins de tarde ou dias não úteis.

Acontecia de vez em quando de o proprietário chegar de inopino: ele fazia de conta que corria atrás de todos e saíam eles num assustado atropelo, para rir depois, em grupos, a gabarem-se os meninos, quase heróis, por terem conseguido safar-se do pega mais uma vez.

Cineminha do Carmo, na segunda-feira à noite, esse era divertimento sagrado. Ninguém perdia. Ingresso acessível, o frade na porta, a acolher os fiéis cinéfilos mirins e adultos. O Zorro, Charlie Chan, Gato Félix, algumas das atrações.

Às matinés de domingo, no Cine Sabará, só se ia eventualmente, que o dinheiro para alguns do grupo era muito curto. Foi grande sucesso ali o inolvidável “Marcelino, Pão e Vinho”.

O Bar do Japonês, no Largo do Carmo, gozava de merecida fama com seus deliciosos sorvetes de massa, os de creme em especial.

O sobradão, ponto de encontro. Vetusto, majestoso.

Ereto estivesse, seria uma das melhores mostras de um passado glorioso, justamente quando Itu se faz “quadricentenária”, expressão que se ousa criar, a salvo da linguagem castiça. O pretenso vocábulo nasceu num repente.

Na parte térrea morava a família dos humildes zeladores, com um pomar imenso e completo. Nesse local, instalou-se a tipografia do seu Luís, gráfico e jornalista emérito, trazida de Capivari, com o fim precípuo de possibilitar impressões nos tecidos para a Cia. São Pedro, serviço a que se prestavam justamente as suas máquinas. Vendida, anos depois.

De tantas recordações, ficou marcada como se retrato fora e que se visse agora com a mesma nitidez, a cena que a gente presenciou de suas imensas janelas, a dos soldados, expedicionários brasileiros, de volta da Itália, sendo recebidos e aclamados, ao subirem a Barão do Itaim.

Essa Casa do Barão – a autêntica portanto – de dimensões enormes, ostentava uma porta monumental, semelhante às das Igrejas centenárias, com nada menos de três imensas janelas de cada lado. 

Faça-se, pois a ideia de seu tamanho, tanto mais que não tinha recuos, nem frontal nem lateral, como existe atualmente no prédio moderno que o substituiu. Aliás, falar em substituição, neste caso, é mera força de expressão. Insubstituível o “sobradão”, quanto ao seu porte, localização e imponência.

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