Colunistas

Publicado: Sexta-feira, 11 de março de 2011

Há dignidade no estremecer do planeta

Acordei e como de costume alcancei meu celular para saber as horas. Passei o olho nos highlights do twitter e me deparei com um terremoto no Japão. Imediatamente pensei em meus cunhadinhos que andavam por lá. Apenas para pouco tempo depois ver sua mensagem de que já haviam deixado o país e estavam em paz em Bangkok. Pensei em um bom amigo que mora por lá, e logo também vi sua mensagem. Abalado após a terra tremer bem tremida sob seus pés, mas bem o suficiente pra escrever e se dizer chocado.

Comecei a ver as mensagens postadas por todos num tsunami de informação que, verdade, não destrói necessariamente nada, eventualmente constrói, e une o mundo ao redor de momentos como este. Momentos que permitem um extravazar de emoções. Algumas delas ligadas diretamente ao evento, mas a maioria apenas desviadas, ou como se diria num bom jargão psicanalítico: resultado de processos transferenciais. Não que não sejam dignas as emoções, pois são. A dor provocada pela tragédia, a comoção e a compaixão são importantes, bonitas e, creio, ajudam de alguma forma que desconheço. Mas grande parte desta comoção vem do uso deste fato como motivo para deixar sair nossos próprios sentimentos de medo, angústia, cansaço, insegurança. Olhar para a tragédia do Japão nos é, ainda, mais fácil do que olhar para nossas pequenas tragédias. Aquelas que nos são tão próximas que ao olhar pela janela, nos passam sob os olhos desapercebidas. Esta nos impressiona pois não deu a ninguém a opção de ignorá-la, e tememos encontrar uma destas pelo nosso caminho.

Devo dizer, sem sombra de dúvida, que me dói cada vítima, cada sofrimento, cada morte provocada pelo terremoto de tão grande envergadura. Falo isso com sinceridade. Mas devo dizer também que respeito o movimento que o planeta faz, como faz qualquer ser vivo, e dou graças ao fato de que este planeta siga vivo e se movimentando, pois sua imobilidade nos seria mais fatal do que seus movimentos. A tragédia acometida sobre as pessoas em um evento como este é a tragédia de ser um ser vivendo em uma cadeia muito maior, da qual, como digo repetidamente, somos apenas uma parte.

Inaceitáveis para mim são as tragédias pessoais e familiares, mortes, doenças e sofrimento provocadas pela falta de recursos que são desviados por governates corruptos e gestores irresponsáveis da estrutura pública. Inaceitável é a morte de uma criança em um hospital enquanto passa férias na Europa o filho de um gestor público, com o dinheiro que deveria ter salvo aquela vida.

Não sei dizer porque o terremoto me provocou esta linha de pensamento, mas foi isto que esta estremecer do que está parado me provocou, e divido aqui com vocês um lampejo de consciência de que há certa dignidade divina em um terremoto. Aqueles que são vitimas de algo assim, de certa forma são vitimas de nossa vida humana, natural, animal, integrados no mundo de que fazemos parte. Indesejáveis, sem dúvida, mas naturais. Não é, como escutei aqui e ali, uma tragédia planetária, é uma tragédia humana. O planeta tá apenas se movimentando.

Por fim, pensamentos de compaixão e desejos de que seja aplacado o sofrimento dos que se encontram imersos e próximos desta tragédia permearão nosso dia, e convido a todos a meditarem por isso hoje.

Comentários