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Publicado: Terça-feira, 22 de agosto de 2006

Ciência, religião e vida

" Um grande ato de fé acontece quando uma pessoa decide que não é Deus." (Autor desconhecido)

" Cada vez se torna mais claro que o progresso é também um progresso das possibilidades de destruição, e que o Homem talvez não esteja moralmente à altura da própria inteligência, transformando-se as suas capacidades em capacidades para destruir. " (Cardeal Joseph Ratzinger)

Pode parecer, em muitos momentos e situações, que haja uma disputa entre religião e ciência, uma queda de braço que muitas vezes impede ou desaconselha o uso do progresso e das descobertas científicas. Na verdade a Igreja sempre apoiou e mesmo estimulou o progresso científico e o seu uso, desde que para o bem da vida, para o bem do homem; em contrapartida, é radicalmente contra todo uso da ciência e de suas conquistas quando estas de alguma forma ameaçam a vida, não importa como, em que fase ou condições ela se encontre.

É bem verdade que, num passado não muito distante, a Igreja e a ciência andaram se estranhando... Mas é sempre bom lembrar que boa parte dos cientistas daquela época eram igualmente religiosos.

Episódios como os que envolveram Galileu e Darwin acabaram criando fortes conflitos entre Ciência e Religião, felizmente superados, mas que insistem em querer voltar, principalmente por culpa dos avanços desmedidos do meio científico. Orgulhosos de suas descobertas, esquecem nossos cientistas que a vida não perdeu sua essência humana e, muito menos, a divina.

Religião é a nossa ligação com Deus; a salvação da alma e mesmo algumas questões de ordem moral ou de tensões e conflitos da vida humana são específicas da religião e da Igreja; já a ciência cuida da nossa ligação com as coisas naturais, o que não torna menor sua importância.

Ciência e religião não se opõem. É fato que a religião busca a verdade; igualmente a ciência não pode fugir da verdade, sob pena de se tornar um ultraje à humanidade. A racionalidade em que se pauta a ciência e a espiritualidade cultivada pela religião podem e devem conviver pacificamente. Se a sociedade é hoje fortemente marcada pela ciência e pela tecnologia, sempre foi e continua marcada pela religiosidade.
A secularização da sociedade moderna, especialmente dos países mais "desenvolvidos" tem levado o homem a se apoiar - e mesmo se conformar - com a capacidade da ciência e da tecnologia em encontrar soluções para o seu bem viver. O forte desejo de viver sem Deus, de não precisar de Deus, de substituí-lo ou mesmo colocar-se em seu lugar, tem materializado fortemente o seu humano moderno. É algo sedutor: o conforto proporcionado pelas máquinas, aparelhos e utensílos, os avanços cirúrgicos e terapêuticos que cuidam satisfatoriamente da dor e do sofrimento querem tornar a religião cada dia mais secundária.

A dúvida é se o progresso científico e tecnológico sempre esteve ou está a serviço da vida, da melhoria de sua qualidade. É verdade que nos tempos de nossos avós morria-se de "verminoses", tirava-se água do poço, a luz era das lamparinas, passava-se roupa com ferro de brasa, andava-se de carroça. Uma vida de muito trabalho, simples, de pouco "divertimento", de pouco consumo, mas de muita tranquilidade, de muita qualidade, de grande chance de se ter paz e de ser feliz. Talvez as "preocupações" da vida moderna matem mais que o "trabalho" da vida antiga.

Muito embora grande parte dos cientistas vejam a religião como uma "barreira" aos avanços da ciência, a verdadeira religião - da caridade, do amor, da honestidade, do escrúpulo, da compaixão, da justiça, do perdão, do respeito, da lei e da ordem moral e ética... - nunca atrapalhou ninguém; os problemas começam quando interesses outros entram em cena, manipulando de maneira desumana a vida própria e a alheia. Parece que o problema está na "esperteza" e na ganância, no orgulho e na avareza do homem que acaba cético e mal-intencionado, vendo na religião e nos seus ensinamentos inimigos mortais para realizar seus sonhos, seguindo unicamente sua vontade... Não importa a profissão, é sempre possível ser humano e cristão!

A isso juntamos as palavras de João Paulo II: "... nem tudo aquilo que for tecnicamente possível, é lícito moralmente" e as do nosso papa Bento XVI: "Com a mesma compaixão que tinha Jesus pelas multidões, a Igreja sente hoje também como sua missão pedir, a quem tem responsabilidades políticas e competências no poder econômico e financeiro, que promova um desenvolvimento baseado no respeito da dignidade de todo o homem. Há que incluir neste esforço também a efetiva consideração do papel central que desempenham os autênticos valores religiosos na vida do homem enquanto resposta às suas questões mais profundas e motivação ética para as suas responsabilidades pessoais e sociais. "

O problema é que apostamos e acabamos confiando demais na ciência, no progresso e nas descobertas científicas sendo cada vez mais clara a desilusão: os avanços científicos que, sem dúvida, prestam grande ajuda à vida física e biológica, pouco ou quase nada têm feito para resolver os graves problemas do relacionamento humano, antes podendo agravar o materialismo que já assola a humanidade.

Precisamos de progresso material, mas este não pode ficar sozinho e soberano e deve ser controlado por um equivalente progresso humano; afinal, tão ou mais grave que a miséria material é a miséria humana.

Reconheçamos, a religião pode fazer muito pelo coração e pela alma...

Longe de nós o pessimismo que não ajuda e a descrença que não leva a nada, podemos e devemos continuar alimentando a esperança de um mundo novo, mais humano e melhor.

Ao final, ciência e religião acabam, por métodos, enfoques e interesses diferentes, responsáveis pelas mudanças do homem e do mundo. No entanto os riscos dos avanços da ciência, mormente suas "criações" consumistas e lucrativas são inquestionáveis e necessitam de um forte controle, papel que cabe muito bem à religião.

Ainda, nas palavras de Bento XVI: " o impulso primordial do homem, de fato, é seu desejo de felicidade e de uma vida plenamente realizada" e que, longe de ser um obstáculo, "Deus garante a felicidade", mas admite que "Hoje, contudo, muitos pensam que esta realização tem de se alcançar de maneira autônoma, sem nenhuma referência a Deus e sua lei. "

A Deus o que é de Deus, ao homem o que é do homem. Somos corpo e alma, matéria e espírito, inteligência e vontade, conhecimento e sabedoria, razão e fé, luta e oração... Entre o comodismo e a preguiça que leva a esperar tudo de Deus e a soberba, o orgulho que leva o homem a querer fazer tudo sozinho, uma verdade in

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