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Publicado: Domingo, 5 de setembro de 2010

Ah! Os velhos tempos...

Ah! Os velhos tempos...

Sei que vai parecer papo de velho, talvez seja. Mas é que antigamente os assaltantes faziam a coisa toda com mais charme; o tal do glamour! Os planos eram ambiciosos e traziam um quê de desafio. Eram subversivos pois desafiavam instituições insuspeitas. Quem não se lembra do assalto ao trem pagador ? Ou da saga do ladrão justiceiro, Robim Hood? Isso sem falar nos inúmeros e sensacionais crimes perfeitos que, deram certo e exatamente por isso, não tivemos notícia nenhuma deles? Pois bem, hoje em dia as coisas estão diferentes, roubam-se hospitais públicos! Fico imaginando o sujeito tendo um insight genial: "Já sei! Vou assaltar um hospital público!! Como não pensei nisso antes...?". O ser humano é um espanto! Isso aconteceu no tempo em que era palhaço do elenco dos Doutores da Alegria.Em nossos encontros semanais quase sempre alguém tinha uma boa história prá contar. Estava lá o Dr. Manjericão, acompanhado do Dr. João Grandão e seu inconfundível figurino laranja, para mais um dia de trabalho no hospital. Era para ser um dia rotineiro não fosse a loucura do mundo ter pregado mais uma de suas peças. Os dois palhaços besteirologistas perceberam que estava acontecendo alguma coisa muito diferente. Um movimento estranho. Havia agitação no ar, um reboliço e; incrível, não haviam provocado aquela situação. Logo, em ritmo de fofoca - no melhor estilo CNN - chegava a explicação: O Hospital houvera sido assaltado! Aí começaram os relatos, às vezes contraditórios, mas sempre verdadeiros: - Os caras estavam com metralhadoras e renderam o pessoal da tesouraria. - Eram dois caras, saíram rapelando todo mundo, estavam armados! - Parece que um era menor de idade... - E o pior é que parece que um deles está escondido aqui no hospital. Já saíram dois, mas um ficou... A essa altura, os dois palhaços pensaram em suspender o dia de trabalho. Afinal, se era verdade que as informações eram contraditórias, também era verdade que a possibilidade de virar refém do tipo de assaltante que rouba hospital público e ainda fica para trás na hora da fuga é bastante temerária! Apesar de os dois palhaços serem adeptos do lema pouco glamuroso, mas bastante pragmático, segundo o qual "mais vale um covarde vivo do que um herói morto.", trataram de se acalmar e tentaram continuar o trabalho. Era difícil disputar a atenção com um episódio digno de filme de televisão. Só se falava no assalto. Os palhaços perderam a graça e qualquer possibilidade de foco. Trabalhar estava quase impossível. Logo, ficaram sabendo, por fonte segura, seguríssima, que haviam sido roubados todos os vales-refeição do hospital. Era a informação que os palhaços esperavam para dar a volta por cima! Chegaram no saguão de entrada do hospital - que estava repleto como nunca viram antes - se aproximaram da primeira rodinha, onde se discutiam as várias versões do assalto, e cochicharam no ouvido de um senhor: - Escuta aqui, nós temos alguns vales-refeição com preços promocionais, caso o senhor se interesse poderemos fazer um trambique, digo, um bom negócio... Àquela altura, a versão do assalto dos vales-refeição já era a mais bem aceita em toda a comunidade e o efeito da oferta do palhaço foi bombástico! Gargalhadas e aqueles tapinhas nas costas de aprovação: - Ai meu Deus, vocês são demais! Só vocês para fazer a gente rir numa hora destas... E a piada foi tão boa que os dois palhaços não tiveram nenhum tipo de constrangimento ou pudor em repeti-la em cada nova rodinha de fofoca que encontrassem pela frente. E a fórmula se mostrou bastante eficiente. A proposta dos palhaços era sempre acompanhada de risadas e de uma sensação de alívio. As pessoas se davam conta de que nada é tão sério e que podemos rir de qualquer coisa. Não se teve notícia do paradeiro do ladrão que diziam ter ficado dentro do hospital. Não importava mais, afinal o dia dos palhaços já estava salvo.

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