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Publicado: Domingo, 16 de outubro de 2011

A vida e o tempo da gente

A vida e o tempo da gente
Nada somos perto do tempo: ele é o dono de tudo!!!

Ainda que eu tente fingir ou fugir, alguns temas são recorrentes e eles me perseguem mentalmente.  Tento mudar o foco distraindo-me com tarefas domésticas, música, ou TV, mas no final as doidas palavras, as que moram dentro de mim e que têm vida própria, vencem a batalha e se libertam em forma de texto.  Por isso escrevo. Preciso vomitar as doidas palavras do meu pensamento.

E o tempo é tema que me persegue; volta e meia ele bagunça meus sentimentos.  Ele que não tem pena da gente e que devora tudo que vê pela frente quase nos enlouquece, porém, também, muito nos ensina. É a complexidade da vida.  De um lado, a saudade imperando a vontade de congelar a lembrança; de outro, a certeza de que “a vida é muita curta para ser pequena”, como diz o filósofo Mário Sérgio Cortella, impulsionando o desejo de viver intensamente.

Meu filho completou 18 anos, idade simbólica em nossa cultura para fazê-lo adulto, responsável e cidadão.  Vejo nele a empolgação pela vida, a descoberta da identidade e o desejo imenso de mudar o mundo.  Isso me alegra, só a juventude quebra os paradigmas dos nossos tempos.  Além do que, eu bem sei como a juventude necessita dos ideais, do engajamento filosófico e político e da certeza de que se é possível transformar o mundo. São esses sentimentos, mais tarde, revestidos de maturidade e sabedoria que nos permitem compreender que a maior transformação está dentro da gente mesmo. E que a vida é uma grande roda: a todo tempo podemos nos transformar e transformar o outro. 

Meu filho me transformou. Com ele aprendi a combater as certezas fáceis; a enxergar a vida como ela é; a valorizar a rotina da casa e a tomar decisões pensando no bem coletivo. Foi com ele que entendi que as grandes emoções moram nas pequenas coisas da vida, como ouvir a gargalhada gostosa de um bebê ou observar o marido trocando a fralda do seu filho pela primeira vez.

Por isso o tempo mexe tanto com os sentimentos: ele carrega as cenas que nos transformaram.  No jovem de 18 anos mora o bebê que me fez sair correndo do trabalho, sem se importar com as conseqüências na carreira profissional, para carregá-lo no colo no auge de uma febre alta. Mora, também, a criança que me fez sentir o quanto se pode amar um homem quando ele, ainda exausto do trabalho, é capaz de ler 10 vezes a mesma história para o seu filho.

O tempo é inexorável. E o que pode ficar dele são as lições bem aprendidas, a compreensão dos sentimentos e a certeza de que somos humanos, inacabados e aprendentes. Mas, para isso é preciso ter a mente aberta, disposta ao movimento constante da reflexão e ao enfrentamento da verdade. Exercício difícil, sem espaço para arrogância e vaidade, orgulho e maldade, de quase toda uma vida. Aliás, estou bem convencida de que é esse mesmo o sentido da nossa existência. De uma forma ou de outra, com ou sem dinheiro, no frio ou no calor, seremos todos devorados pela “imensa boca do tempo”.

Não somos nada perto do tempo. Ele é o dono de tudo, como diz o escritor Bartolomeu Campos de Queirós, e nos ensina a todo tempo que o tempo é curto. Que a lição tem que ser agora e que nada ficará prá depois.

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