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Publicado: Quarta-feira, 27 de setembro de 2017

A paz que mora ao lado

Crédito: Photos&Focos A paz que mora ao lado

A vida é repleta de acontecimentos que muitas vezes nos tiram o chão, derrubam nossas certezas e desequilibram nossa existência. O que fazer diante de alguns fatos incontestáveis? Rezar, pedir, mudar, agir, implodir, enfim, como proceder quando é tirado de nós as bases para um existir mais ou minimamente equilibrado?

 

A vida é um solucionar de problemas constantes. Acordamos e já estamos pensando, articulando e agindo em prol de resolver nossas questões, sejam elas internas ou externas. A paz acaba que se transforma num requintado artigo para horas extras nas raras férias anuais (e olhe lá).

 

Se viver é estar em constante movimento em direção de nossos planos e necessidades e obrigações, então, parece-me que a “paz de espírito” é alguma coisa que deve estar em conciliação com a forma como encaramos a vida e todo seu aparato existencial. Não alcançaremos uma paz absoluta e muito menos uma condição de equilíbrio pleno, o que podemos ter é proporcional com as imperfeições e ignorâncias de uma vida repleta de equívocos e turbulências. Ou seja, não será perfeito, pelo menos não por muito tempo. A paz que mora ao lado será na mesma medida que a paz compartilhada com os outros que coexistimos.

 

Não tem hora certa para refletir sobre a vida e sobre nós mesmos. É necessário fazer isso no meio do que vier, no meio do caos, em calmarias, seja onde for, é necessário fazer isso dentro da dinâmica da própria vida mesmo, porque o que adianta refletir somente em momentos tranquilos e relaxados? É necessário se perceber também quando estamos em conflito, refletir inseridos no meio em que vivemos com todas as variáveis que normalmente temos que lidar, porque senão caímos no erro de achar que o pedófilo se curou por ter ficado preso por 10 anos numa prisão que não possui crianças.

 

Não é possível viver numa guerra constante consigo mesmo e com o entorno e mesmo assim ter uma dinâmica saudável. Faz-se necessário atentar para o que provocamos no outro e por que. As razões que nos levam a agir e a manifestar nossas afecções promovem percepções e reações naqueles que nos rodeiam e isso nos serve como referencial daquilo que estamos sendo. E cabe a pergunta: É a imagem que desejamos passar? É o efeito que desejamos causar no outro? O que queremos de verdade? O que escondemos por detrás das máscaras da sociabilidade perfeita?

 

Vivemos uma vida inteira projetando no outro, ou nos outros, nossas frustrações, medos, equívocos, modos de ser, retirando assim de nós o papel de sujeitos de nossa própria história e, isto posto, anseio saber onde esse movimento nos auxilia nas resoluções efetivas de nossos problemas? Se não temos a posição de “sujeitos” de nossa história de vida, escolhendo nossos caminhos e tomando decisões, então, nunca dependeu de nós o que nos aconteceu e nem o que vier a acontecer? Ou seja, não devemos e nem podemos fazer nada a respeito do que nos acomete todos os dias?

 

Essa é uma hipótese satisfatória? Quando se coloca numa posição passiva e deixa a vida te levar e a culpa está sempre emergindo no outro, que nos atormenta e incomoda, fica realmente satisfeita com os resultados que colhe no processo? O desfecho é positivo? Será que não temos culpa de nada? Nunca? Onde fica nossa responsabilidade na vida que vivemos juntos todos os dias e os compartilhamentos que fazemos a todo momento? Quem somos nesse universo de pão e facebook? Qual o nosso papel na felicidade dos outros?

 

A paz que mora ao lado não é uma paz isolada e independente, é uma paz que também precisa ser acalentada e construída com ações em conjunto. Refletimos no outro nosso estado de espírito e as ações alheias dependem também de nossa postura com relação a vida como um todo. O que quero dizer com isso? A nossa paz depende e influencia a paz alheia.

 

Mais uma vez vale salientar a ideia de que não adianta desejar “paz” se não promove “paz” ao outro. Como animais gregários, animais que vivem coletivamente, é necessário entender que nossas ações realizam mudanças e construções no universo comunitário e, principalmente, no espaço afetivo de quem nos cerca. E mais uma vez, a paz que mora ao lado também é a nossa paz e faz parte das responsabilidades sociais que herdamos quando nascemos.

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