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Publicado: Quinta-feira, 6 de março de 2014

A dor da perda

A dor da perda
Não tenho vergonha de ficar nua! Na essência da existência as roupas não escondem os sentimentos mais profundos que nos habitam...

 Meus textos são recheados de sentimentos vivenciados; eles me inspiram a tecer o fio condutor do que pretendo dizer. Mas nem tudo o que está escrito é o que estou sentindo ou vivendo. Afinal,  “todo escritor é um fingidor” − ou seria todo poeta? −; não importa. Quem disse isso mesmo? O desejo mais puro de um escritor, seja ele poeta, cronista ou romancista, na hora de escrever é lançar um jogo de emoções entre ele e o leitor, instigando assim, pelas palavras, uma possível reflexão desta louca e complexa existência humana.

Ocorre que escrever é se mostrar por inteiro, despir-se, ficar nu. Já recebi vários comentários de pessoas queridas, dizendo-me para deixar de escrever, porque nem todos compreendem o sentido literário do que está dito nos meus textos, tornando-me exposta demais.  

Não, eu não paro de escrever.

Não tenho vergonha de ficar nua! Na essência da existência as roupas não escondem os sentimentos mais profundos que nos habitam...  E eles moram em mim e em você, sem distinção de cor, etnia e raça. Estamos todos nus!

Quero falar das dores e dos amores perdidos sem medo, sem culpa, sem fraqueza. A dor é um sentimento rejeitado pela sociedade e pelos que estão a sua volta. A nossa cultura do riso e das alegrias forçadas não aceita a dor como um sentimento humano, real e legítimo. Lya Luft diz que lidamos mal com a dor uns dos outros. É verdade! Não sabemos respeitar o seu tempo e a sua evolução. Estamos sempre esperando a felicidade mostrada na vitrine, ainda que seja um pacote de ilusão.

Quando me deparei com a dor da perda, entendi que precisava me recolher para viver o luto até o seu mais profundo sentimento de dor: chorei, afastei-me, fugi, desmanchei-me. Sabia de forma consciente que o tempo de luto, vivido num período sensato, seria necessário para me refazer e renascer.

No entanto, não foram poucos os recados enviados por pessoas bem-intencionadas, para que eu me arrumasse e saísse de casa; mostrasse aos outros que eu estava inteira, forte, poderosa. Lamentavelmente não pude atender aos tais conselhos. Preferi viver, no meu canto, o período em que a dor recebe permissão para se manifestar dentro da gente, conduzindo os desejos mais primitivos: quebrar as lembranças, rasgar o passado, retirar os cacos e varrer a alma.

 E por mais que a sociedade insista na cultura da felicidade fingida, não há nada de fraqueza nessa atitude. Ao contrário, sem o luto “a dor ficará soterrada debaixo de futilidades, sua raiz enterrando-se mais fundo, seu fogo queimando nossas últimas reservas de vitalidade e fechando todas as saídas”, como diz Lya em seu “Perdas & Ganhos”.    

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