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Publicado: Sexta-feira, 4 de abril de 2008

A Caminho da Cruz...

Acabamos de viver mais uma Semana Santa. Uma semana de liturgia e de catequese. Com exceção daqueles insensíveis, capazes de ignorar quase tudo que venha incomodar sua “vidinha tranqüila”, para nós cristãos é realmente uma semana muito rica.
 
A cada ano vai crescendo a nossa intimidade com aqueles fatos e somos invadidos por sensações e sentimentos novos. Uma questão surge em nossa mente: Que perigo seus inimigos conseguiram ver nele, que era todo amor?
 
De fato, ao revivermos a sua história, a da nossa Salvação, vamos percebendo que, ao passar dos dias, duas forças surgem em torno de Cristo, num antagonismo crescente.
 
De um lado a força da amizade que desenvolveu com os pobres, os oprimidos, os excluídos, marginalizados, os chamados de pecadores, os sem ninguém, os doentes, sofredores, explorados, o povo na força da expressão, os sem voz e sem vez. Fez-se um desses; tomou suas dores, seus pecados; compadeceu-se deles; fez-se sua voz, sua luta.
 
Essa multidão de necessitados envolvia sua vida o tempo todo. Interessados em quê? Mesmo sem alcançarem a extensão, viam nele um Salvador; uma esperança; um homem especial, uma autoridade diferente de tudo que conheciam e haviam experimentado. Estes aproveitaram a presença de Cristo.
 
Mas a profecia havia anunciado um Rei libertador. Certamente Cristo nada tinha desse esperado Messias. Mas, o aumento de sua popularidade começou a preocupar muita gente... E se ele fosse realmente o tal rei que deveria assumir o poder, liquidar os inimigos e libertar seu povo? Seria bom ficar alerta e se preparar para antecipar ações.
 
Estava aí delineada a segunda força que envolveria Jesus: a daqueles que viram nele um inimigo público, uma ameaça ao sistema sócio-político-religioso de seu tempo. Era preciso defender seus interesses, seus domínios, seus postos, cargos...
 
Chamemos à memória a cena do Domingo de Ramos: Entrada triunfante de Jesus em Jerusalém; alegria, fé e compromisso. A multidão que o precedia e que o seguia era uma só voz: “Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor, o rei de Israel!”
 
Sexta-feira Santa. Instala-se o grande contraste; sai de cena o triunfo, entra a humilhação. Muda a melodia, alteram-se os sentimentos, os interesses; agora o povo quer sua morte: “Crucifica-o!”. Onde está a multidão dos seus “amigos seguidores”? O que temos é um coro metamorfoseado, convincente, determinado. De repente, parecia que Ele só tinha inimigos. Ninguém para defendê-lo, tomar as suas dores, interceder por Ele. Seria muito perigoso. Melhor calar-se, como de fato se calaram. Permanecem ativos os interessados em sua morte, como cautela, como defesa, como espetáculo, sedentos do sangue do cordeiro, manso e pacífico. Sem culpa. O próprio Pilatos ainda tentou, mas foi vencido pelo desejo popular, manipulado pelas autoridades.
 
Deveria morrer porque representava um perigo à estabilidade do poder dominante. “É bom que morra um só...”. Frase de grande significado: expressão do egoísmo humano na sua mais ampla dimensão; reflete o pensar só em si, nos seus interesses, o desejo de vencer, de dominar.
 
Bem que o próprio Cristo queria que fosse ele o único, ou o último a se sacrificar pela salvação da humanidade, pela sua conversão, pelo fim do pecado e da maldade. Mas não foi isso que aconteceu; o cenário – desde o pretório até o calvário – não foi desmontado; a cada dia novos personagens ocupam-se das cenas: “pilatos” a lavar as mãos diante das injustiças e dos atentados à vida; condenados e carrascos a cumprir as ordens de execução; povo aclamando, vibrando, torcendo; a cada dia novos “cristos” são crucificados por razões diversas – são os inimigos do sistema que tentam com sua coerência de vida, com suas denúncias expressas ou tácitas, mudar o cenário, mas diante dos interesses reinantes, precisam ser eliminados.
 
Por isso a Semana Santa é sempre atual, cada dia mais real.
E nós, que já participamos de inúmeras Semanas Santas, o que achamos de tudo isso? Qual o nosso posicionamento diante desse rico cenário? Com quem nos identificamos? Que resposta de vida estamos dispostos a dar? 
 
Podemos refletir nas palavras que o Pe. Antônio Geraldo Dalla Costa (CS) escreve sobre a Semana Santa: “Por amor, Ele veio ao nosso encontro, assumiu os nossos limites e fragilidades, experimentou a fome, o sono, o cansaço, conheceu as tentações, tremeu perante a morte, suou sangue ao aceitar a vontade do Pai; e, estendido no chão, atraiçoado, abandonado, incompreendido, continuou a amar.”
 
Diante da pergunta - O que significa hoje contemplar a Cruz?, finaliza: “Significa assumir a mesma atitude e solidarizar-se com aqueles que são crucificados neste mundo: os que sofrem violência, os que são explorados, os que são excluídos, os que são privados de direitos e de dignidade…
 
Significa denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo;
Significa evitar que os homens continuem a crucificar outros homens;
Significa aprender com Jesus a entregar a vida por amor…”
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